06/08/2018 12:35
Rosilene Miliotti¹
Com objetivo de conhecer, refletir e apontar erros e acertos no desdobramento e execução da chamada pública Assistência Técnica Rural (ATER) Agroecologia desenvolvida pelo programa da Fase no Mato Grosso (MT) entre 2014 a 2018, o seminário foi realizado na perspectiva de uma construção de continuidade de ações. “O projeto de ATER Agroecologia foi realizado durante pouco mais de três anos em seis municípios da Baixada Cuiabana e em Cáceres, articulando 500 famílias e realizando uma analogia com o trabalho do Centro de Tecnologia Alternativa (CTA) na região sudoeste do estado do Mato Grosso”, explica Leonel Wohlfahrt, educador da FASE no MT.
Cerca de 60 pessoas participaram do encontro e durante a atividade houve troca de sementes e mudas e vendas de produtos feitos pelos agricultores, como o pão com a farinha de cumbaru e o furrundu². De acordo com a equipe da FASE no MT, um dos maiores ganhos foi em relação ao incentivo a organização das famílias. “Conseguimos fazer um trabalho para fortalecer a organização social e ajudar na construção de grupos de auto-organização das mulheres, por exemplo. Mas o maior ganho ficou por conta das reuniões de formação e capacitação, inclusive na questão dos direitos, de se sentirem cidadãos e cidadãs detentores de direitos. Pelo relato das famílias, percebemos que a FASE conseguiu despertar isso nelas. Isso nos deixa muito felizes porque estamos vendo a transformação na vida dessas pessoas”, comemora Fátima Aparecida Moura, coordenadora do programa da FASE MT.
Foco nas mulheres e jovens do campo
Com atenção especial para as agricultoras familiares e os jovens, as ações ainda encontram dificuldade em acessar esses grupos. Para Fátima, o maior problema de organizar grupos de jovens, por exemplo, é o fato de eles saírem das comunidades, muitas vezes para estudar. “A partir daí eles começam a ter outra dinâmica em relação às comunidades”, comenta. Além disso, ela destaca que ainda há os fatores como o machismo e a pouca democracia no interior das famílias para entender que os jovens podem tomar decisão e acessar os projetos. “Os pais não acreditam no potencial da juventude do campo e esses jovens tem que ficar provando isso o tempo todo”, pontua.
Para a adolescente Adalbiany Siqueira de Oliveira de Luq, do assentamento Corixinha, a vida no campo pode lhe dar um futuro. “Acho que os jovens só querem curtir, dançar. Eu também quero, mas depois quero voltar para a roça. Tudo lá me atrai. Acho lindo ver aquele verde, a calmaria. Nas cidades só tem prédios, carros, fumaça, barulho. É tudo muito cinza. Já morei na cidade e não gostei”, conta ela que cuida da Horta Mandala na comunidade, um projeto executado pela FASE na comunidade. “Cuido de casa, aparto bezerro, cavalo e estudo. A escola fica longe e muitas vezes o ônibus quebra no meio do caminho. Estou no 9º ano e pretendo me formar em Direito, mas morando no campo”, planeja.
Já a agricultora Odete Batista de Araújo, comemora a implementação da apicultura na comunidade Laranjeira, na região do Pantanal. “A ideia inicial foi do meu companheiro e começamos o trabalho há dois anos com a assessoria da FASE. Ainda temos dificuldade, principalmente em achar os materiais adequados como a cera para a melgueira³”, conta ela que confessa que tinha medo de trabalhar com as abelhas. “Depois de ir a campo com os ‘meninos’ da FASE, vi que era uma outra experiência. Usamos as roupas adequadas e acabou o medo. Hoje eu vou sozinha olhar as abelhas”, brinca Odete. Ela destaca também que o trabalho é interessante porque “se aprende o tempo todo”. Em breve será a primeira vez que o grupo irá colher mel. “Na captura das abelhas nós colhemos 12 litros e já vendemos, mas foi pouco. Agora estamos nos preparando para colher mais e vender o produto”, confia.
Impactos do pós-golpe
Fátima lembra que durante a execução do projeto houve o golpe e Michel Temer assumiu o governo. Após isso, diversas medidas impactaram em projetos e políticas públicas em andamento. “Com o golpe nós tivemos que diminuir a equipe técnica. Além disso, também não tínhamos mais acesso às políticas públicas que nós estávamos trabalhando para que essas famílias acessassem [Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), por exemplo]. Porém o mais significativo negativamente foi a alteração do PAA. A redução dos recursos para o PAA impactou profundamente nesse projeto. Nossos resultados poderiam ter sido melhores, mas isso nos fez recuar”, lamenta.
Fátima diz que haverá continuidade na assistência técnica para as famílias agricultoras, mas com ajustes. Após apresentar proposta ao Fundo Amazônia, a FASE continuará a assessorando as famílias, só que um número menor. “Passaremos a assessora 300 famílias. Acredito que teremos mais resultados positivos porque agora iremos trabalhar os sistemas produtivos e continuar fortalecendo o processo de auto-organização desses grupos. Para os jovens, nossa ideia é de continuarmos com projetos relacionados ao trabalho com as mídias sociais, projetos audiovisuais, de comercialização de alimentos e incentivar a criação de aplicativos para ajudar no relacionamento com os consumidores”, antecipa.
Veja outras fotos da atividade no Flickr da FASE.
[1] Jornalista da FASE.
[2] Doce típica da região feito com mamão e melado.
[3] Onde se fabrica o mel.